Observe as duas frases seguintes:
– Enviamos o material aos alunos, mas nada receberam de nós.
– Ele recebeu a herança do avô.
Aparentemente o verbo “receber” tem o mesmo sentido e o mesmo padrão sintático em ambas as frases. É, porém, somente aparência mesmo. Vejamos a explicação:
Na primeira frase, o verbo “receber” significa, segundo o dicionário Houaiss, “chegar às mãos de alguém ou aceitar algo que lhe é enviado, oferecido ou entregue por alguém”. Quando isso ocorrer, o verbo será bitransitivo, ou seja, exigirá a existência de dois complementos, um denominado de objeto direto, sem preposição alguma, e outro denominado de objeto indireto, com a preposição “de”. Nessa frase, o objeto direto é o termo “nada”, e o objeto indireto, “de nós”. Os verbos bitransitivos também são denominados de transitivos diretos e indiretos.
Na segunda frase, porém, o verbo “receber” significa, também segundo o Houaiss, “entrar na posse de”. Quando isso ocorrer, o verbo será transitivo direto, ou seja, exigirá a presença de um complemento sem preposição, o objeto direto. Nessa frase, o objeto direto é o termo “a herança do avô”, cujo núcleo é “herança”, pois ela é que foi recebida.
E a expressão “do avô” da segunda frase? Que função sintática tem?
Sempre que houver, na análise sintática de uma oração, a expressão “algo de alguém”, em que o “alguém” possui o “algo”, a expressão toda formará uma única função sintática, o “algo” será o núcleo dessa função, e o “alguém”, seu adjunto adnominal, que pode ser representado por um substantivo ou por um pronome. Por exemplo:
– O emprego dos funcionários está garantido.
Nessa frase, há a expressão “algo de alguém – o emprego dos funcionários”, em que “os funcionários” possuem “o emprego”. A expressão toda, portanto, formará uma única função sintática: O que está garantido? Resposta: “O emprego dos funcionários” – sujeito simples, cujo núcleo é “emprego”, e “os funcionários”, adjunto adnominal.
O substantivo “funcionários” pode ser substituído por um pronome:
– O emprego deles está garantido.
– O emprego de todos está garantido.
– O emprego de muitos está garantido.
– O emprego de vocês está garantido.
Todos esses pronomes exercem a mesma função sintática: adjunto adnominal do núcleo do sujeito “emprego”.
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Outros pronomes podem ser usados: os pronomes oblíquos átonos me, te, lhe, nos, vos, lhes, que se ligarão diretamente ao verbo. Observe atentamente:
– O lutador imobilizou o braço do adversário.
Nessa frase, há a expressão “algo de alguém – o braço do adversário”, em que “o adversário” possui “o braço”. A expressão toda, portanto, formará uma única função sintática: “Quem imobiliza, imobiliza algo”; o verbo “imobilizar” é, então, transitivo direto. O lutador imobilizou o quê? “o braço do adversário” – objeto direto, cujo núcleo é “braço”, e “o adversário”, adjunto adnominal.
O adjunto adnominal “o adversário” pode ser substituído pelo pronome “ele”:
– O lutador imobilizou o braço dele.
Pode também ser substituído pelo pronome oblíquo átono “lhe”, que se ligará diretamente ao verbo e continuará a ser adjunto adnominal:
– O lutador imobilizou-lhe o braço.
Se o possuidor do braço fosse outra pessoa, o pronome oblíquo átono seria outro:
– meu braço: O lutador imobilizou-me o braço.
– teu braço: O lutador imobilizou-te o braço.
– nosso braço: O lutador imobilizou-nos o braço.
– vosso braço: O lutador imobilizou-vos o braço.
– o braço deles: O lutador imobilizou-lhes o braço.
Todos os pronomes funcionam sintaticamente como adjunto adnominal.
Veja outro exemplo:
– Não passou pela cabeça do jovem estudante que pudesse ser ele o centro das atenções.
Nessa frase, há a expressão “algo de alguém – a cabeça do jovem estudante”, em que “o jovem estudante” possui “a cabeça”. A expressão toda, portanto, formará uma única função sintática: O verbo “passar”, segundo o dicionário Houaiss, será transitivo indireto, com a preposição “por”, quando significar “manifestar-se repentinamente, por pouco”, portanto “a cabeça do jovem estudante” é o objeto indireto do verbo “passar”, cujo núcleo é “cabeça”, e “o jovem estudante”, adjunto adnominal.
O adjunto adnominal “o jovem estudante” pode ser substituído pelo pronome “ele”:
– Não passou pela cabeça dele que pudesse ser ele o centro das atenções.
Pode também ser substituído pelo pronome oblíquo átono “lhe”, que se ligará diretamente ao verbo e continuará a ser adjunto adnominal:
– Não lhe passou pela cabeça que pudesse ser ele o centro das atenções.
Se o possuidor fosse outra pessoa, o pronome oblíquo átono seria outro:
– minha cabeça: Não me passou pela cabeça que pudesse ser eu o centro das atenções.
– tua cabeça: Não te passou pela cabeça que pudesses ser tu o centro das atenções.
– nossa cabeça: Não nos passou pela cabeça que pudéssemos ser nós o centro das atenções.
– vossa cabeça: Não vos passou pela cabeça que pudésseis ser vós o centro das atenções.
– a cabeça deles: Não lhes passou pela cabeça que pudessem ser eles o centro das atenções.
Todos os pronomes funcionam sintaticamente como adjunto adnominal.
Observe que a cada mudança de possuidor, mudou-se outro pronome na oração subsequente: eu, tu, ele, nós, vós, eles. Esses pronomes exercem a função de sujeito da outra oração, pois “Quem pudesse ser o centro das atenções?” Resposta: eu, tu, ele, nós, vós, eles, respectivamente.